Com apoio da 5ª Câmara de Coordenação e Revisão, especialmente de seu coordenador, Nicolao Dino, e do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o Ministério Público Federal apresentou à população vários tópicos para alterações legislativas.
Atingindo-se 1,5 milhão de assinaturas, o assunto será encaminhado ao Congresso Nacional como projetos de lei de iniciativa popular.
É importante que se diga desde já que são apenas propostas para, uma vez tornadas projetos de lei, serem debatidas mais a fundo com toda a sociedade, dentro do local adequado, o Parlamento.
Não se quer impor absolutamente nada. Muito menos, segundo algumas críticas, excluir direitos fundamentais dos investigados/processados. A solução será no âmbito do Congresso Nacional.
A intenção do MPF é apenas propor uma (re)discussão dos temas como forma de aprimoramento da apuração e responsabilização daqueles que cometem o (grave) delito de corrupção, notadamente aqueles com repercussão de desvios de milhões de reais dos cofres públicos.
É sabido que a redução do nível de corrupção não está atrelada necessariamente à punição (inclusive pelo uso do Direito Penal) como forma de responsabilização dos delinquentes de tão grave coturno. Passa, inicialmente, por mudança cultural da sociedade, em acabar de vez com as "mínimas corrupções", sempre e ainda alicerçadas na conhecida "Lei de Gerson", em que "o importante é sempre levar vantagem em tudo, certo?".
Errado! Muito errado.
Depois, combater a corrupção passa, em nosso sentir, por uma mudança de postura dos órgãos de Estado para que, sempre mediante o devido processo legal (sem excessos, mas sem deficiências), sejam efetivamente responsabilizados -- inclusive criminalmente -- aqueles que se apropriam de forma tão espúria, egoística e sem escrúpulos dos recursos que são da coletividade em prol de interesses de poucos.
Sim, a corrupção mata!
Diferentemente de alguns posicionamentos, temos absoluta convicção de que, em casos graves de corrupção, o uso da pena privativa de liberdade cumulada com a perda do produto dos crimes e a imposição de severas penas pecuniárias têm resultados positivos para a coletividade (prevenção geral) e proporcionalmente na punição dos criminosos que cometem esses delitos (prevenção especial).
É muito comum escutarmos críticas de que o "Direito Penal não resolve o problema da criminalidade". Não é bem assim.
Talvez pela falência do sistema prisional brasileiro (que leva a uma verdadeira inversão do raciocínio jurídico nos últimos tempos em nossa terra), esse dogma (repetido à moda de Goebbels) até poderia fazer um pouco de sentido em relação à "criminalidade tradicional" que ocupa os presídios. Não há dúvida para nós que a o sistema carcerário brasileiro reclama urgente reorganização.
Mas esse fato não pode impedir a responsabilização com pena de prisão dos agentes que cometem a corrupção, logo no momento em que se iniciam novos caminhos para a limpeza desse câncer que está impregnado na cultura brasileira.
Esconde-se da população brasileira que, no direito comparado, os delitos de corrupção são tratados de forma absolutamente firme e com imposição de penas graves de reclusão, além das consequências de ressarcimento dos cofres públicos dos danos causados e de penas pecuniárias altíssimas.
O delito de corrupção não pode compensar em nenhuma de suas vertentes. No "cálculo de eficiência do criminoso de colarinho branco", a perda da liberdade é algo que está fora de cogitação: para esse delinquente, é ela quem está em primeiro lugar.
A perda do patrimônio auferido com os crimes, embora também não desejada, está "na conta" de eventuais prejuízos.
Ferrajoli enfatiza (por aqui, no Brasil, alguns não revelam isso ...) que o Direito Penal precisa ser utilizado:
"O Estado deve preocupar-se notadamente com as infrações cometidas pelos cabelleros - corrupção, balanços falsos, valores sem origem e ocultos, fraudes fiscais ou lavagem de dinheiro"
Democracia y garantismo (2008, p. 254)
A expansão do Direito Penal (Silva-Sánchez) deve ser racional, para os crimes que realmente importam.
Não temos dúvidas de que o Direito Penal será mais um meio importante para mudar esse panorama, com a efetiva e dura responsabilização dos delinquentes lesa-pátria. Sempre com o respeito dos direitos fundamentais, mas não apenas os individuais de primeira geração.
A coletividade também espera a devida proteção, mediante atuação positiva e eficaz (sempre proporcional) do Estado. Assim o é em várias democracias globais.
Precisamos urgentemente mudar nossa cultura, inclusive com a aplicação do Direito Penal.
***Artigo de Douglas Fischer, publicado no blog da ANPR no HuffPost Brasil. Mestre em Instituições de Direito e do Estado. Professor de Direito Penal e Direito Processual Penal.