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Não deixem acabar com o Ministério Público


Procurador da República Carlos Alberto Aguiar(PR/RJ) - Publicado no O Globo (18/06/2013)

A Constituição da República promulgada em 1988 conferiu ao Ministério Público atribuições que realçaram sua condição de importante ferramenta na defesa dos interesses da sociedade, o que permitiu, por exemplo, o aperfeiçoamento na defesa dos direitos das minorias, crianças, idosos, homossexuais, mulheres e negros, além do combate à criminalidade, fiscalização do uso de verbas públicas, dentre outros direitos coletivos.

Muitas vezes o exercício dessas funções acaba por contrariar interesses, sobretudo políticos, até porque, algumas vezes, o Ministério Público é o único instrumento de reação da sociedade para inibir abusos cometidos por quem possui poder político e econômico. Não por acaso tem sido recorrente a tramitação de projetos de lei que invariavelmente procuram diminuir ou mesmo lhe retirar atribuições, numa clara tentativa de afastar os obstáculos eventualmente existentes para os desmandos e malversações da coisa pública.

A versão mais visível dessa estratégia está hoje concentrada no Projeto de Emenda Constitucional 37 ou PEC 37, de acordo com o qual as investigações criminais caberão exclusivamente às policias civil e federal. A iniciativa, que ganhou fôlego principalmente após o processo do Mensalão, muito embora atinja outras instituições públicas, como o Banco Central, Receita Federal, Ordem dos Advogados do Brasil, além do próprio particular, todos alijados do direito de investigar infrações penais, visa a alcançar diretamente o Ministério Público de forma a enfraquecê-lo sem o excluir do contexto jurídico. Assim, muito embora mantido o status constitucional de guardião da sociedade, retiram-se os instrumentos para o adequado cumprimento dessa função, como uma doença que preserva o corpo mas debilita as funções vitais.

De forma a amesquinhar a discussão do tema e, ao mesmo tempo, ocultar as reais finalidades do projeto, opõe-se o Ministério Público às polícias como se o que estivesse em jogo fosse apenas uma luta de classes corporativas. Nada mais equivocado, sobretudo porque o Ministério Público deseja e luta por uma polícia eficiente, o que passa pela adequada remuneração de seus integrantes e o melhor aparelhamento de suas estruturas.

O monopólio da investigação criminal é ineficaz e não contribui para a redução do número de inquéritos que terminam sem a solução dos ilícitos apurados. Portanto, retirar do Ministério Público o poder/dever de investigar não traz nenhuma vantagem para a preservação do Estado Democrático de Direito. Felizmente o Congresso Nacional, em sua franca maioria, tem consciência disso e saberá dizer não a esse movimento contrário à sociedade.

Quem não quer um Ministério Público atuante e eficiente são os marginais, venham eles das favelas cariocas ou dos altos escalões do poder. O enfraquecimento da instituição, antes de qualquer coisa, representa o enfraquecimento da grande maioria da população, brasileiros honestos aos quais se faz o apelo: Não deixem acabar com o Ministério Público!

Carlos Aguiar é procurador da República do Ministério Público Federal no Rio

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