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ANPR na Mídia: Presidente da ANPR destaca que procuradorias têm déficit de cerca de 600 vagas

O jornal "O Liberal" publicou neste domingo (14) matéria de capa com o presidente da ANPR, Ubiratan Cazetta.

Em entrevista ao jornal, o presidente da ANPR destacou que, atualmente, existe um déficit de 600 procuradores no País. Além disso, falou sobre o rastreamento de operações clandestinas e a sobre como deve ser a escolha do procurador-geral da República (PGR).

 

Leia a entrevista concedida à repórter Valéria Nascimento: 

 

Quais são as suas prioridades neste segundo mandato (2023-2025) à frente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR)? 

O primeiro olhar é para dentro, para garantir que a entidade (ANPR) esteja aberta a todos, o que nós estamos chamando de escuta ativa, ouvir a todos e reconhecer que a diversidade nos fortalece. 

Há previsão de novos concursos públicos, há déficit de procuradores da República?

A carreira é composta por três níveis. Atualmente, há 74 procuradores-gerais, que são o topo. Procuradores regionais da República, que é o meu caso, que são quem atua junto aos três tribunais federais, estamos na casa de 230, e cerca de 800 membros no primeiro grau. Praticamente, não é um número redondo, mas há 600 vagas não preenchidas, criadas por lei e que nunca foram preenchidas. Obviamente, elas não serão preenchidas de uma única vez, até pela necessidade de formação, adequação. Mas, o Congresso Nacional, em algum momento, entendeu que o número ideal de procuradores da República ficava ali em torno de 1.400, nós nunca chegamos nem perto. Ficamos na casa dos 800. Isso dá uma dimensão do déficit. 

A Associação tem proposta para resolver esse déficit?

Nós estamos com um concurso público em andamento, na última fase, que é a fase oral, pouquíssimos candidatos chegaram até aqui, nós temos apenas 40 pessoas habilitadas à fase oral de mais de 6 mil inscritos. Temos um número de vagas muito grande para preencher. Formalizamos isso e a administração pública, via MPF, já indicou que vai haver um novo concurso, talvez, ainda, no início do segundo semestre. 

A Associação fará alguma articulação junto ao Congresso, neste momento, de construção do arcabouço fiscal?

A gente sabe da importância do equilíbrio fiscal, essencial para o país, mas há uma amarra tão forte, que atualmente você só consegue substituir uma pessoa que se aposentou depois que ela sair do quadro. Nós não podemos ser comparados com o poder Executivo e usar os critérios do Executivo para o Judiciário e o MP. Por quê? Porque o Executivo tem um orçamento com muitas obras, envolve políticas sociais, como saúde e educação, portanto, ele fica muito maior. O MP e a magistratura são especialmente compostos por pessoas. Por conta desta questão (limite de gastos), nós precisamos fazer uma reestruturação em nossas unidades em todo o Brasil. E nós, que estávamos com dificuldade, tivemos de reorganizar, fundir e até sair de algumas cidades. O Pará fechou em Tucuruí.

A presença física qualifica o trabalho?

A presença física é importante, eu reconheço que hoje, especialmente, depois da pandemia, isso ficou mais visível, você tem outros mecanismos de estar num local sem ser presencial. Mas em uma instituição nacional em que, muitas vezes, os dois membros que estão lá não são da região ou não são do Norte, enfim, essa presença física possibilita conhecer a realidade e quebrar mitos. 

E sobre a escolha do procurador-geral do MPF?

Esse é um tema essencial para nós, da Associação, e que a gente quer debater com a sociedade. Vamos lançar um cronograma e vamos debater com a sociedade e com o próprio presidente da República por que um procurador-geral a partir de uma indicação geral de membros ou não. Esse tema é essencial para a nossa Associação. 

Quais os principais desafios da atuação do MPF na Amazônia?

Uma coisa é a realidade de Belém. Outra coisa é pensar o interior. Juruti fica numa região distante no Baixo Amazonas, difícil para se chegar até lá e a população tem tanto direito de contar com o sistema judiciário quanto qualquer pessoa de um centro maior. Precisamos ter uma discussão real no Brasil sobre qual é o tamanho do Judiciário que se quer para o país. 

Como resolver a complexidiade dos conflitos na Amazônia?

Eu me recuso a usar a expressão garimpo clandestino, porque garimpo me remete e, acho que a todos nós, há uma compreensão de uma coisa artesanal, à pessoa que se lança individualmente, vai lá sozinho tentar ganhar alguma coisa. Não é isso. O que nós temos na Amazônia são grandes empreendimentos clandestinos. Nenhum desses empreendimentos clandestinos instalados em áreas indígenas, no Pará, em Rondônia, no Arco da Amazônia, nenhum deles têm um custo menor do que milhões de reais. São máquinas caríssimas que são postas na mata e um sistema de pessoas trabalhando que envolvem uma série de ilegalidades. Essas ilegalidades, a gente já vinha denunciando há anos, somente agora houve uma mudança que parece boba, mas ela é muito importante, que é a obrigatoriedade da emissão de nota fiscal pelas atividades de mineração. Qualquer boteco, qualquer vendinha em Belém tem que emitir nota fiscal eletrônica, o setor de mineração emitia nota fiscal manual, até recentemente, até um mês atrás. E o que isso causa? Na hora que você vai investigar, você não tem uma rastreabilidade dos dados, você não tem acesso a isso, aos dados de forma visível e essa discussão a gente já travava desde 2017.

Em 2018, nós entramos com uma ação contra isso e só em 2023 isso foi mudado por conta do que aconteceu com a [Terra Indígena} Yanomami. Então aquilo que era um problema de ilegalidade envolvendo um grupo de pessoas que circulava, ilegalmente porque tinha dinheiro faz-se hoje em vários lugares. Você tem a entrada da criminalidade organizada. E isso não é só discurso. Não é da boca para fora, "ah, o crime organizado, as organizações criminosas estão entrando". Não. Você tem a demonstração clara de que essas organizações perceberam a quantidade de dinheiro que circula ali e a facilidade.

Qual a sua opinião sobre o PL das Fake News?

A primeira regra é a seguinte: você tem de ter responsabilidade sobre o que você faz. Se eu vier aqui e falar um monte de mentiras, é responsabilidade minha assumir o resultado do que eu falei. Não podemos continuar com essa ideia de que o mundo virtual é uma terra sem lei. A todo direito corresponde um dever, os romanos já diziam isso lá atrás, antes de Cristo.

O direito é por natureza uma expressão contra majoritária ou contra a situação de dominação. É inevitável que o Google e a Apple sejam empresas grandes porque eles ofereceram um produto que chamou a atenção de todos. Ok. O problema é quando essa posição de domínio passa a possibilitar que essas pessoas explorem o que elas quiserem.

Os portais que produzem notícias, como O Liberal, têm um processo de conhecimentos, estudos, de pesquisas para produzir uma matéria, que será apropriada pelo Google e a empresa não recebe nada. Ou seja, eu pesquiso um tema qualquer, lá encontro na matéria produzida pelo Liberal que demandou todo um esforço da empresa, acesso, leio, tenho uma vantagem daquilo e não pago nada. Eu não pagar nada é a minha negociação com o Google. Agora o Google não pagar nada é outra coisa. Por quê? Porque ele ganha não diretamente o meu pagamento, mas ele ganha indiretamente, de novo, pelo fato de eu ser um usuário e ele vende esse acesso como informação. Estamos falando de empresas imensas que ganham um lucro extraordinário e que não querem reconhecer que parte desse lucro vem do fato de elas não estarem pagando corretamente quem produz a sua matéria-prima, porque o que eles vendem é isso: acesso à informação.

Essa discussão não se resolve com palavras-chaves: "ah, isso vai atrapalhar o seu acesso à internet", "você não terá mais direito a um amplo acesso à internet". Isso não é verdade. O acesso à internet tem que respeitar as regras clássicas e uma delas é: pagar, remunerar quem produziu o produto, aquilo que está sendo vendido, ainda que o vendido não seja nos modos clássicos que pagava-se antigamente.

 

Assista a entrevista na íntegra:

 

 

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