Dalva Almeida. Por trás deste nome está a, hoje, subprocuradora-geral da República aposentada que, em 1982, ao assumir uma vaga no Ministério Público Federal (MPF) recebeu a missão de prosseguir com as apurações do chamado “Escândalo da Mandioca”, um esquema de fraude na obtenção de créditos agrícolas, em Pernambuco, que resultou em um prejuízo de cerca de R$ 34 milhões aos cofres públicos.
Somado ao peso do caso, estava o fato ainda mais relevante e trágico de que Pedro Jorge, o procurador que encabeçava as investigações, fora assassinado. Uma morte encomendada em decorrência do trabalho incessante para identificar os integrantes da quadrilha e buscar a responsabilização de todos eles.
Por trás do nome Dalva Almeida está também uma escritora, que eternizou a atuação de Pedro Jorge num livro. O título é o nome do caso. Ela não conviveu com o procurador, sequer o conheceu pessoalmente. A decisão de produzir a obra ocorreu ao perceber que, a atuação do colega, e todo aquele fato que chocou o país, poderiam ficar no esquecimento.
“Uma vez eu ouvi uma conversa de colegas dizendo que este caso tinha que ser esquecido, Pedro Jorge tinha morrido e que devíamos partir para outra. Aí eu pensei, não podemos esquecer. E uma forma de não esquecer é colocar no papel. Então eu resolvi escrever. Foi uma forma de render um pleito à figura de Pedro Jorge, a quem eu sempre admirei e admiro cada vez mais. O livro oferece ao leitor uma parte de uma versão de um caso que abalou o Brasil. A sociedade se sentiu ferida e disse não, disse basta. Foi um caso que, muitas vezes, eu parei para chorar e depois continuar a escrever”, relembrou.
Dalva lembra que assumir o caso não foi fácil. “Não foi fácil assumir um fato de tamanha repercussão, um esquema com o envolvimento de pessoas dispostas a frear cada avanço da investigação e calar a instituição. As investigações principais feitas pela Polícia Judiciária estavam acostadas aos autos. As principais dificuldades por mim enfrentadas, após assumir o processo, foram as ameaças de morte contra mim e minha família, contra meus filhos, meu marido e até minha mãe. Eram telegramas, telefonemas para a Procuradoria, cartas anônimas. Até meu carro teve o pneu traseiro esquerdo atingido por uma bala”, descreveu.
As tentativas de intimidação não a inibiram. Ela contou que foi com temor que recebeu a notícia da indicação para atuar no processo. O cenário contribuiu para isso, visto que teve o nome apresentado após diversas recusas de procuradores de estarem à frente das investigações, diante dos riscos que o caso oferecia. Mas, não deixar o esforço de Pedro Jorge “morrer na praia” falou mais alto e representou quebra de paradigmas.
"Com a morte de Pedro Jorge, o drama que se desenvolveu, houve grande simpatia em todo Ministério Público. E também a atuação dos colegas dentro da ética tornou a figura do Ministério Público muito simpática e a figura do herói, do mártir Pedro Jorge certamente contribuiu para todas as conquistas que tivemos na Constituição de 88”.
Quando questionada se podemos falar em um Ministério Público antes e depois de Pedro Jorge, imediatamente, respondeu. “Isso é importantíssimo porque Pedro Jorge é aquela pessoa que abriu a porta da democracia, então, a partir daí se houve a conscientização de que as coisas tinham que mudar.
O livro “O Escândalo da Mandioca”, de Dalva Almeida, vai ser lançado pela ANPR este ano em formato digital.