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Debate aborda participação social e desafios para o MPF

A necessidade de aproximação do Ministério Público Federal (MPF) com a sociedade civil, ampliando espaço de participação popular no dia-a-dia da instituição foi o ponto em debate, na noite de terça-feira (26), dentro da programação do XXXVII Encontro Nacional dos Procuradores da República (37º ENPR). O encontro “O MPF e o diálogo com a sociedade” reuniu o professor titular da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB) José Geraldo de Sousa Júnior; o sócio-fundador do Instituto Socioambiental (ISA) Márcio Santilli; a coordenadora-geral da ONG CRIOLA, Lúcia Xavier; e o integrante da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Alexandre Conceição.

Mediador do debate, o diretor de Comunicação da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Julio José Araujo Junior, dedicou o painel ao procurador da República Jorge Medeiros, falecido neste ano, que considerava o tema essencial para o aperfeiçoamento do Ministério Público. ”Que possamos honrar o legado que ele deixou. É um tempo muito relevante para fazemos um balanço sobre o que o MPF fez ou deixou de fazer para ser essencial à democracia. O que podemos melhorar, de que forma nossa instituição pode contribuir para essas questões. A importância dos movimentos sociais na luta é fundamental, pensar em MPF sem pensar os setores importantes da sociedade é um erro. Proponho uma grande conversa e que, a partir do diálogo, consigamos sair daqui e aprofundar e fortalecer a democracia no nosso país.”

O professor José Geraldo de Sousa Júnior lembrou da criação do projeto O Direito Achado Na Rua e lembrou da promessa constitucional na criação do Ministério Público, que deve ser um mediador da cidadania. “Naquela altura, em 1987, quando lançamos o projeto, havia uma mediação que abre o horizonte de inclusão, descolonizando, retirando os obstáculos, trazendo as lutas históricas à luz do direito. Nunca perdemos de vista esse horizonte, na linha de radicalizar o espaço de interlocução do MP com a sociedade civil pujante, reivindicatória, pelos sujeitos sociais que se instalam na esfera pública e inventam direitos. A democracia é um sistema de invenção de direitos, é um modelo de sociedade e nesse modelo, o MPF é o grande mediador”, defendeu.

Lúcia Xavier abordou de forma crítica a maneira como o sistema de justiça é atingido pelo racismo institucional. “Instituições que se arvoram a proteger usam práticas violentas e excludentes. O papel do MP reverbera também na qualidade e condição de vida das minorias. Quando falamos da ameaça à democracia, é importante lembrar que esses órgãos deixam de cumprir esse papel há muito tempo. Por isso, falo do racismo institucional que acabou impedindo o acesso ao direito e a luta pela justiça. Justiça que, certamente, passará a ser interpretada pelas vias que vão estabelecer mais violência, como se houvesse só um intérprete para o direito e a justiça. Não temos representação política, nem como usuários nem como membros de organizações. Temos, há séculos, tentado informar que essa democracia convive com o racismo e a violência gerada por ele. O que vale uma organização que não escuta a si mesmo e aqueles que a sustentam?”, questionou.

Alexandre Conceição reconheceu o trabalho do Ministério Público em temas relevantes de direitos humanos ena concretização da reforma agrária, mas lembrou também que nem sempre o órgão e o sistema de justiça conferem o devido respeito aos movimentos sociais. “O estado brasileiro sempre nos teve como inimigos. 99% da população nega a nossa existência ou nos criminaliza. Nesse caso, o Estado é punitivo. Esse é o estado de coisas no Brasil: branco, autocrático que nos nega o direito de produzir alimento. Se produzimos, hoje, 70% do que consumimos, é por causa dessa nossa luta. Mas gostaria de levantar um ponto que precisamos debater muito: é que, sem meio ambiente, não tem como produzirmos alimento”, afirmou. Para Alexandre, o MP que ele quer é “um MP de portas abertas, que atenda às necessidades do povo que mais necessita, não apenas o direito de participar, mas tenham a participação efetiva”.

Márcio Santilli destacou a crise atual das instituições no nosso país. Para ele, a PEC 5, votada na semana passada, serve de alerta para a necessidade de aperfeiçoar o Ministério Público. “Não esperava que se colocasse em votação uma proposta que fragiliza a organização do MP no estado brasileiro. Mas acredito que a derrota não deveria ser lida como uma vitória do MP. Ela dá um recado de que se espalhe no Congresso, em algumas instituições e na sociedade que há excessos no MP que devem ser sanados. É importante que a instituição reveja isso para continuar exercendo seu importante papel”, apontou. No final, ele mencionou o art. 232 da Constituição para ressaltar que o Ministério Público deve ser um companheiro dos grupos sociais minoritários.

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