A Folha de São Paulo publicou, nesta sexta-feira (25), artigo do presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Fábio George Cruz da Nóbrega, sobre as forças-tarefas no âmbito do Ministério Público Federal (MPF). De acordo com o procurador regional, a regulamentação é necessária para aperfeiçoar o modelo de investigação, mas é importante que ela garanta, especialmente, perenidade e estabilidade no trabalho a ser realizado enquanto houver necessidade de que as investigações prossigam. Além disso, que mantenha-se a necessária independência da atuação dos seus membros.
"A Associação Nacional dos Procuradores da República, ao tempo em que reconhece os serviços de excelência prestados por todas as forças-tarefas em operação no país, particularmente no MPF, apoia as discussões em curso que visam ao aperfeiçoamento do referido modelo de sucesso, no Brasil e no mundo, no combate à corrupção e à criminalidade organizada", escreve Nóbrega, no artigo.
Confira a íntegra do artigo
Forças-tarefas: modelo mundial de sucesso no combate à corrupção e ao crime organizado
No século passado, as forças-tarefas se constituíram em modelo internacional de sucesso em muitos países, sendo primeiramente utilizadas em grandes ações militares. Na lógica de sua constituição, estava a compreensão de que, para grandes operações, seria necessária a junção de esforços, de agentes, de equipes.
Posteriormente, o modelo foi transposto para as grandes e complexas investigações criminais realizadas pelo mundo. Assim, foi adotado, por exemplo, na Itália, para investigar e combater a máfia e a corrupção sistêmica; nos Estados Unidos para reprimir o tráfico de drogas, o terrorismo e outras práticas criminosas graves.
Em suma, diante da estruturação e do fortalecimento do crime organizado, mostrava-se essencial que o Estado também viesse a se organizar e a se fortalecer para permitir o enfrentamento adequado das organizações criminosas.
No Brasil, tais iniciativas vêm sendo utilizadas com bastante êxito já há duas décadas, no enfrentamento da corrupção, da criminalidade organizada, bem como em outras frentes como a defesa dos direitos humanos, dos direitos indígenas e do meio ambiente.
Atualmente, só no Ministério Público Federal, estão em funcionamento 23 forças-tarefas, todas desenvolvendo um trabalho técnico primoroso, que mudou o paradigma de atuação da instituição, com a obtenção de resultados bastante significativos para a sociedade e o país.
A Lava-Jato é, apenas, um dos exemplos de forças-tarefas existentes. Certamente, a mais conhecida, por haver desencadeado a maior operação anticorrupção realizada no país e uma das maiores do mundo.
Só nos últimos seis anos, as forças-tarefas constituídas no âmbito do MPF foram responsáveis –em números já defasados, posto que consolidados apenas até o primeiro trimestre deste ano– por 319 ações criminais e 90 ações civis promovidas, 330 acordos de colaboração premiada e 26 acordos de leniência firmados, 940 investigações instauradas e 607 inquéritos policiais abertos. Milhares de denunciados, centenas de condenados em duas instâncias e valores já recuperados aos cofres públicos em montante superior a R$ 5 bilhões, ainda existindo um potencial de reversão ao erário superior a R$ 30 bilhões.
A partir desses números, é possível avaliar a grandeza do trabalho desenvolvido. Como todo serviço público prestado, é importante, claro, que aperfeiçoamentos naturais ao modelo utilizado sejam discutidos e implementados. Aliás, todos os que atuam na área pública devem considerar normais as críticas construtivas dirigidas e, a partir delas, buscar melhorias em sua atuação.
Há, de fato, aperfeiçoamentos que precisam ser adotados no funcionamento das forças-tarefas, como, por exemplo, na seleção de seus membros a partir de regras objetivas e na garantia de estrutura material e humana adequadas para permitir o pleno desenvolvimento de suas atividades, saindo-se da sistemática atual de prorrogações incertas e precárias. É importante garantir, especialmente, perenidade, estabilidade no trabalho a ser realizado enquanto houver necessidade de que as investigações prossigam.
Tudo precisa ser feito, claro, a partir de uma discussão transparente e democrática, bem ainda mantendo-se a necessária independência da atuação dos seus membros, livres de ingerências internas ou externas, conforme preveem a Convenção contra o Crime Organizado Transnacional – Convenção de Palermo (art. 9º, item 2) – e a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção – Convenção de Mérida (art. 6º, item 2, além dos arts. 11 e 36) –, já que tal independência aproveita a própria sociedade, que seria a real prejudicada na hipótese de interrupção da atuação dessas equipes por represálias decorrentes de interesses políticos ou econômicos contrariados.
Frise-se, por fim, que em todo o período de seu funcionamento a atuação das forças-tarefas vem sendo objeto de escrutínio continuo da Corregedoria-Geral do MPF, do Conselho Nacional do Ministério Público e do próprio Poder Judiciário. Em todo esse tempo, não foi identificado qualquer fato desabonador que pudesse caracterizar a ocorrência de atuação irregular.
A Associação Nacional dos Procuradores da República, ao tempo em que reconhece os serviços de excelência prestados por todas as forças-tarefas em operação no país, particularmente no MPF, apoia as discussões em curso que visam ao aperfeiçoamento do referido modelo de sucesso, no Brasil e no mundo, no combate à corrupção e à criminalidade organizada.