A propósito de informações desencontradas sobre o procedimento estabelecido pelo Código de Processo Penal para o oferecimento de denúncias por membros do Ministério Público, a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) vem a público esclarecer:
A denúncia, petição inicial da ação penal pública, pode ter por base provas colhidas em inquérito policial, mas não está limitada a ele. De posse de quaisquer provas, o membro do MP avalia se há indícios ou não da prática de delito e pode oferecer denúncia. A titularidade privativa da ação penal, expressamente prevista no artigo 129, inciso I, da Constituição da República, legitima o membro do Ministério Público a analisar todo o conjunto probatório para decidir, de acordo com sua independência funcional, se há indícios de autoria e materialidade de crimes e, a partir disso, apresentar a denúncia.
O indiciamento realizado pela autoridade policial não vincula o entendimento do membro do Ministério Público. Não raras vezes, a autoridade policial realiza indiciamento de determinadas pessoas e o membro do Ministério Público não oferece denúncia, promovendo o arquivamento da investigação. Também não é incomum que a autoridade policial não indicie determinada pessoa e o MP entenda que há indícios da prática de crime e ofereça denúncia. Todos esses procedimentos se inserem no âmbito da independência funcional e das atribuições inerentes à titularidade da ação penal.
Esse legítimo exercício das atribuições previstas na Constituição e na legislação processual penal não pode ser caracterizado como crime de abuso de autoridade. No ponto, a própria lei de regência excluiu de sua tipificação a divergência na avaliação de fatos e provas e na interpretação de dispositivos legais.
A denúncia oferecida pelo Ministério Público está sujeita à análise do Poder Judiciário, que poderá recebê-la ou rejeitá-la, total ou parcialmente. Eventual decisão de rejeição ainda pode ser submetida a recurso por parte do membro do MPF, tudo em observância ao sistema de freios e contrapesos estabelecido e em harmonia com as balizas do Estado Democrático de Direito.
A autonomia do Ministério Público e a independência funcional de seus membros não se coadunam com a vinculação ao entendimento das autoridades policiais eventualmente externadas em relatórios constantes de inquéritos policiais. Da mesma forma, a livre análise das provas está inserida nos mesmos postulados e se constitui em exercício legítimo das funções ministeriais.
Diretoria da Associação Nacional dos Procuradores da República